CARACTERIZAÇÃO DO DIREITO MOÇAMBICANO NO PERIODO IMEDIATAMENTE SEGUINTE À INDEPENDENCIA
1. Direito
1.1. Uma continuidade cautelosa
De uma forma geral, depois da indepedência
nacional, o legislador moçambicano não operou mudanças de vulto, verificando-se
portanto, até certo ponto, a continuidade do Direito positivo que vigorara no
período colonial, de matriz romano-germánica. Foi uma continuidade cuidada
(pretendendo-se eliminar algumas das ideologias intrisicamente caracterizadoras
do Direitos colonial opressionisa segregassionista português), na medida em que
haviam algumas ressalvas1.
A Constituição da República Popular de Moçambioque, de 1975, revogou apenas a legislação anterior que fosse comntrária à nova Constituição. Em outras palavras, toda a legislação que que se não demostrasse contrária à ordem Constitucional imposta pela primeira lei-mão genuinamente moçambicana, manteve-se em vigor.
1.2. Desiderato de destruição do Direito colonial e tudo a ele ligado
O direito vigorado no periodo
imediatamente seguinte à independência, caracteriza-se tambem pelo desiderato
de destruir o Direito colonoial capitalista e a sua estrutura judicial – em
virtude de uma decisão da 8ª sessão do Comité Central da FRELIMO havida em
Fevereiro de 1976.
Esta característica, foi resultado do
objectivo de eliminar o poder colonial, no sentido de ser imperativo eliminar
todas a estrutura de opressão e exploração do homem pelo Homem, ligadas ao
colono bem como por via das autoridades tradicionais, tal combate que incluia a
mentalidade que lhes era inerente – tal como preconizava mesmo op artigo 4 da
Constituição da República Popular de Moçambique.
O problema das
autoridades tradicionais
No período
histórico imediatamente a seguir à independência de Moçambique, após o decurso
de uma década de aliança política na guerrilha para expulsar os colonos
portugueses, a liderança da FRELIMO
veio a retratar as Autoridades Tradicionais como oportunistas políticos
corruptos, que haviam lucrado com o seu papel administrativo de cobradoras de
impostos, recrutadoras de mão-de-obra e agentes de policiamento local na
estrutura política colonial portuguesa. Para além disto, a FRELIMO havia testemunhado igualmente,
em alguns casos, a colaboração activa destes agentes políticos nas campanhas de
contra-revolta das Forças Armadas Portuguesas tal como faz mesmo referência o
Lutar por Moçambique de Eduardo Mondlane.
No final da luta
armada de libertação nacional, a FRELIMO
estabeleceu como objectivo político não só a independência de Moçambique do
governo colonial português, mas similarmente a transformação total da sociedade
moçambicanatal como sustentam Abrahamsson e Nilsso e mesmo Ediuardo Mondlane.
Essa
(re)organização social visava impossibilitar o (r)estabelecimento de sistemas
políticos e/ou económicos neocoloniais de governação e exploração, na sequência
da saída dos colonos portugueses, sustentados por intermediários de poder
qualificados de tradicionais.
Após a
independência, a FRELIMO
estabeleceuuma hierarquia político-administrativa do partido-estado, destacando
explicitamente os comprometidos – tal designação que valia para qualquer
entidade que tivesse tido qualquer boa relação com oregime colonial e as
Autoridades Tradicionais, eram umas dessas entidades - de quaisquer posições de responsabilidade
política.
Tal como faz
mensão Vitor Alexandre Lourenço
na obra que temos vindo a citar, “Estado, Autoridades Tradicionais e Transição
Democrática em Moçambique: Questões teóricas, dinâmicas sociais e estratégias
políticas”, a FRELIMO rotulou
todas as instituições políticas e sociais que baseavam a sua reprodução social
na(s) lógica(s) do parentesco e asseguravam os lugares da autoridade política
legítima pela sucessão hereditária, como “feudais, obscurantistas e
retrógradas” (Serra, 1993).
1.2.1.1.
As Autoridades Tradicionais sempre estiveram activas
É de salientar que, apesar da retórica ideológica e
prática(s) política(s) hostis da FRELIMO,
os agentes políticos que o partido-estado rotulava de Autoridades
Tradicionais nunca deixaram completamente de exercer influência no mundo rural,
quer no imediato período pós-independência de Moçambique, quer mesmo durante os
anos em que a FRELIMO implementou
com sucesso político relativo (Vitor Alexandre Lourenço), o seu programa de modernização
socialista.
Por outro lado, os
agentes políticos locais da FRELIMO,dos
quais se destacam os grupos dinamizadores, não manifestavam empenho, ou
conhecimento social suficiente para lidar com algumas particularidades
socioculturais das comunidades rurais (como por exemplo o casamento, o
divórcio, questões de herança, resolução de conflitos familiares e/ou
comunitários, a encenação de rituais de iniciação, de chuva, a súplica aos
antepassados e o controlo da feitiçaria), porém as Autoridades Tradicionais –
quer fossem comprometidas ou não – eram usualmente mais sensíveis a
estas questões sociais e mais competentes para lidar com elas (Lundin,
1995).
Em segundo lugar,
o começo da guerra civil nas localidades rurais de Moçambique apenas
dois anos após a independência fez com que, cada vez mais, as comunidades
rurais se afastassem do Estado e, consequentemente, das instituições e
projectos políticos, sociais e económicos da FRELIMO.
Por outro lado,
alguns governantes locais, nomeados opelo Estado, mantiveram uma relação de
tolerância e até de trabalho com as Autoridades Tradicionais, recorrendo a
estes para o exercício
e manunteção do poder atravez de práticas mágico-religiosas, na
clandestinidade e geralmente à noite.
1.2.2. Banimento
da advocacia
Foi
ainda na senda da alegada eliminação de todas as formas de exploração do homem
pelo homem que O Conselho de Ministros da República Popular de Moçambique fez
publicar o Decreto-Lei Nº 4/75, em 16 de Agosto, que encerra os escritórios de advogados, por ter sido julgada incompatível
a existência de advocacia privada com uma justiça que se irá pôr ao serviço das
largas massas do povo moçambicano.
Em consequência deixou de ser permitido em Moçambique, a título de profissão liberal,
exercer advocacia ou funções de consulta jurídica, solicitar judicialmente ou
praticar procuradoria judicial ou extra judicial, tendo sido criado o Serviço
Nacional de Consulta e Assistência Jurídica” na dependência da
Procuradoria-Geral da República.
O exercício da advocacia privada, foi
considerada um instrumento de exploração do Homem pelo homem, pois o recurso
aos advogados só era possível aos indivíduos da c;asse médias e alta. Página
116 do Conflito e transformacao social V1).
1.3.
Direito Pluralista
O direido vigorada logo após a
independencia, era um Direitro Plural, quer no contexto rural, como no
peri-urbano, sendo que as autoridades tradicionaios foram substituidas pelos
Grupos Dinamizadores.
O sistema tradicional da justiça ou
consuetudinário que visa promover e manter o equilíbio social através da
conciliação, foi substituido pelo Direito aplicado pelos Grupos Dinamizadores.
Os Grupos Dinamizadores eram na verdade
uma continuidades das experiências de participação comunitária nas zonas
libertdadas e foram formalmente institucionalizados no período de transição.
Dentre as várioas funções que
desempenhavam, os Grupos Dinamizadores administravam a justiça em cada bairro
residencial e nas localidades e postos administractivos no caso das zopnas
rurais, resolvendo sobretuidos problemas de natureza Social.
De um outro modo podemos sistentar a ideia
do pluralismo do Direito Moçambicano no período imediatamente à segur à
independência Nacional, com o facto de muitop embora tenha sido suprimido, o
dirteito tradicional sobreviveu e continuou a ser aplicado em determinadas
zonas. Ou seja, o Direito aplicado pelos Grupos Dinamizadores e pelas Aitoridadex
Tradicionais, coexistiu com o Direito forma, Estadualmente emanado.
Importa aqui salientar que apesar de todo
um esforços tendente a evitar, as Autoridades Tradicionais continuaram a
existir e a aplicar o Direito Tradicional, à pedido, quer das populações, quer
das autoridades oficiais locais.
Bibliografia
Vitor Alexandre Lourenço, « Estado, Autoridades
Tradicionais e Transição Democrática em Moçambique: Questões teóricas,
dinâmicas sociais e estratégias políticas », Cadernos de Estudos
Africanos, 16/17 | 2008, 115-138.
Vitor Alexandre Lourenço, « Estado, Autoridades
Tradicionais e Transição Democrática em Moçambique: Questões teóricas,
dinâmicas sociais e estratégias políticas », Cadernos de Estudos
Africanos [Online], 16/17 | 2008, posto online no dia 22 Julho
2012, consultado o 09 Abril 2013. URL : http://cea.revues.org/189 ;
DOI : 10.4000/cea.189
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(1994).Moçambique em transição: Um estudo da história de desenvolvimento
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Lourenço, V. (2004). Estado,
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Lundin, I. (1992). “Relatório
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Lundin, I. (1995). “A
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somatório comentado e analisado”, in I. Lundin e F. Machava (org.), Poder
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Lundin, I.; Machava, F.
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